Sonhei com um estranho em minha casa.
Na memória dos dias mais leves
E dias ensolarados na escola
Mas uma presença sinistra alterava a paisagem.
Corro para casa
Ao chegar, um arrepio na espinha.
As paredes ouviam.
Os cantos rangiam.
Eu estava sendo visto.
Eu estava sendo ouvido.
Nos cantos, meus olhos viam a mim,
e a mim me via.
No pânico, no desespero, corro da minha casa.
Uma voz familiar me afirma:
— Essa não é sua casa, Corvo!
“Mas é minha casa,” respondeu Rafael.
— É?
Acordei.
Sobre “O Diretor”
O texto quase se chamou “Cantos da Casa“, mas…
Misturar o conceito do diretor da escola, dessa figura esguia, branca, inquietante que assombrava a escola do sonho, com a ideia de um diretor de filme, daqueles filmes de terror silenciosos e sufocantes, me pareceu uma justaposição perfeita.
Um filme de terror íntimo, silencioso.
Ontem conversei bastante sobre um tema: a Anima de Jung
Um conceito meio místico, meio psicológico.
Profundamente interessante.
É como uma figura interna, em homens, a parte “feminina” da psique. Em mulheres, seria o Animus.
A Anima é intuição, desejo, sombra, impulso criativo.
Muitas vezes, aparece em sonhos, imagens, amores, obsessões.
Durante a conversa, percebi, ou pelo menos acho, que já tinha uma.
A chamei de Corvo.
Nesse dia, sonhei profundamente com uma escola que retorna com frequência. Às vezes sou eu mesmo como aluno, às vezes não.
Dessa vez, eu era. Mas também não era só eu.
Havia esse diretor: alto, estranho, ameaçador.
Cheguei em casa.
E senti o susto de estar sendo olhado.
Não visto, vigiado.
Via flashes da figura escondida nos cantos da casa, algo assustador, espreitando.
O sonho seguiu até o fim como nesse pequeno texto acima.
Acordei, mas fiquei com ele na cabeça.
Será que foi só um sonho de ansiedade?
Uma ideia apareceu.
Lembrei da conversa sobre projeção da Anima.
Dela ser eu.
E pensei, me divertindo:
E se eu era A Corvo no sonho?
E o Diretor… também era eu?
Cheio de raivas antigas, tristezas acumuladas, partes que empurrei pros porões da minha própria casa interna.
Magro. Pesado.
A casa era eu.
A Corvo era eu.
A voz que diz “Essa não é sua casa, Corvo!” me tirou do chão porque traz à tona a dúvida sobre onde pertenço dentro de mim mesmo. Que o sonho poderia ser sobre isso?
E se essa fusão entre o Rafael que quer ser A Corvo,
e o Rafael que sou hoje
não for bonita como uma fusão de Digimon? Com todos chorando juntos no fim do episódio, enquanto usam o golpe especial.
Pra mim, essa digestão da imagem interna não é doce.
É violenta, lenta, indigesta.
Saturno devora seu filho.
Mesmo na violência, há lágrimas.
A integração exige engolir partes de si mesmo.
Encerrar ciclos.
E então, lembro de outra imagem que é importante nessa figura que eu imaginei:
Abaporu como homem que devora o homem.
Um corpo gigante, que devora a si.
Assim como o sonho:
Desproporcional.
Distorcido.
Como a tatuagem de um corvo
que carrego no braço.
Talvez isso tudo seja só um sonho esquisito.
Ou talvez fosse só isso mesmo:
a cortina era azul.
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