RAFAEL

Meu nome é Rafael, mas pode me chamar de Rafinha. Aqui eu escrevo o que parece verdade na hora. Se amanhã eu discordar de mim mesmo, parabéns pra mim: evoluí ou pirei mais um pouco.

O Torcedor de videogame, o modinha e o Fifa Manager

Publicado originalmente no Weebly em 25/04/2024

O Torcedor de videogame, o modinha e o Fifa Manager

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É inevitável que meus artigos comecem com “Ah, eu estava falando com uns amigos”. Meu amigo Rafael Orsini disse que esse espaço é uma mistura de crônica com diário, e eu verdadeiramente tenho um baita orgulho de pensar nessa dualidade. 

Mais uma vez é o caso. Como é regra no Brasil, sou membro ativo de diversos grupos de Whatsapp, e considero os membros destes bandos de pessoas, meus amigos. Tenho conversas nos mais diversos temas. Algumas das pessoas ainda não tive oportunidade de conhecer pessoalmente, mas são igualmente meus amigos, já que me acompanham nas inúmeras navegações de sentimentos, histórias e casos.

Esse artigo não vai ser diferente. A história nasceu em um grupo de torcedores do Lakers, completamente doidos pelo basquete e pela corneta. Só de histórias deles, teríamos uma dúzia de posts e casos. Algumas delas envolvendo um famoso jornalista que quis arranjar confusão com alguns dos membros, ou sobre equívoco que eles amam me lembrar: em que passei MESES chamando um cara do nome errado, pois pensei se tratar de uma conta (chatíssima do NBA Twitter), mas na verdade era outra pessoa. Morro de vergonha só de lembrar!

Mas enfim, todos ali sabem muito de basquete, bem mais do que eu. Alguns dominam números, treinamento, história e muito mais. Enquanto isso, eu, um mero torcedor do Raptors, fico apenas acompanhando os times e dando minha opinião frequentemente equivocada.

Eles enquanto isso melhoram meu conhecimento geral sobre os temas, e também no foco em desgostar do Boston Celtics. Nisso eles estão tendo bastante sucesso.

Com as introduções feitas, a história começa com um dia desses, eles estavam falando sobre os fãs novos e da popularidade do Denver Nuggets, comparando com o San Francisco 49ers e sua nova popularidade. Era semifinais de conferência, em um jogo Nuggets e Wolves, e nessa conversa, falamos das diferentes formas de torcer, em especial um comparativo entre as torcidas americanas e latinas, e como nós temos uma forma mais intensa de torcer, em uma boa discussão.

Eventualmente chegamos no termo “Bandwagon”, ou quando a pessoa começa a acompanhar e torcer por “modinha”. Em especial dos times que falamos ali. Em outro grupo, o tema da falta de carisma de alguns jogadores e da própria franquia, comparado com o excesso de novos fãs causados pelo sucesso recente dos times, e o ponto de quanto essas torcidas são mais ou menos “verdadeiras” que outras.

Eu, naturalmente, discordo dessa visão simplista, mas tenho uma igualmente simplista, que sei que é compartilhada por um grande público.

Toda torcida que não tem laços históricos começa assim. Começa acompanhando por causa de um jogador, de uma história ou um momento, e dali a coisa continua até virar algo maior.

Pensando bem, foi assim com o Deportivo La Coruña, com o Raptors e com o Washington Commanders, quando ainda era Redskins.

Fotografia

Olha eu em Chicago, vendo o Bulls vs. Raptors. (perdemos)

Afinal, o que faz alguém um fã?

​Torcer para o Cruzeiro Esporte Clube não era uma opção para mim. No momento que nasci, já tinha essa obrigação, e não tinha como. Mas ao falar de esportes diferentes, como os esportes de origens americanas, como escolher um time se você não tem nenhum apego emocional?

Se eu pensasse de forma lógica e racional, aplicando similaridades como onde conheço, laços familiares e até alinhamento político, eu provavelmente teria uma resposta óbvia que não se encaixa com os times que torço.

A verdade é que a história é complexa e cheia de nuances. Por volta de 2004 ou 2005, comecei a me jogar jogos dos esportes americanos. Meu Playstation 2 era 100% dedicado aos games de esporte, e eu me lembro claramente de adorar jogar com o Orlando Magic, especialmente com o Steve Francis. Eu não conhecia a trajetória de Steve Francis, nem sobre sua personalidade, seus problemas ou muito sobre o time do Orlando Magic, capaz nem de saber que o Shaquille jogou lá um dia. O Próprio Steve Francis é um jogador envolto em diversas polêmicas, desde suas tatuagens até suas declarações polêmicas e um passado conturbado, marcado por tráfico de drogas, prisões e outros problemas. Mas eu não sabia disso, apenas me impressionava com os dunks.

Até me lembro de quando comecei a jogar, fui atrás do meu pai, afinal ele sempre foi minha referência de conhecimento e sabedoria. E jogando NBA 2005, não conhecia ninguém naqueles elencos pedi pra ele. E minha mãe sempre lembra dele no telefone, porque ele não morava com a gente na época:

  • Tem o Shaquille O’Neal.
    • Boa pai, esse eu conheço
  • E o Michael Jordan?
    • Acho que já aposentou, não tá no jogo pelo menos…

Depois ele começou a citar nomes como “Nakombi” e uma série de trocadilhos. O Rafinha adolescente anotando, furiosamente, para procurar eles. Não achei, naturalmente, para risada dos meus pais.

Aos poucos, queria me aprofundar no basquete e acompanhar mais sobre o Orlando Magic. Mas com acesso limitado à internet e à escassez de transmissões oficiais durante o período em que vivi no Pará, meu acompanhamento era complexo e difícil. 

Alguns anos depois, quando me mudei para Belo Horizonte, comprei um NBA 2K12 no meu PS3, e joguei tanto que o disco ficou danificado. Mas tudo mudou quando descobri que um time tinha um brasileiro como destaque! A maior nota era dele!

Naquele time do Raptors, com o Leandrinho Barbosa, encontrei uma equipe não só interessante, mas  que eu gostei de jogar. Tinham um estilo de jogo rápido e ofensivo, explorando o contra-ataque, com Andrea Bargnani arremessando de longa e média distância e Leandrinho com suas bolas de três pontos. E com esse time, eu ganhava bastante, seja de quem fosse, amigos, meu irmão, todos perdiam para o time do Raptors!

Continuei acompanhando o time, mesmo com as mudanças e alterações no elenco, me apaixonando por jogadores como DeMar DeRozan e Kyle Lowry, e até pela gestão da equipe. Vibrando com as vitórias e sofrendo com as derrotas, a cada troca de jogadores, questionando cada eliminação nos playoffs, especialmente com o “Lebronto”, e as dolorosas eliminações, e quando me vi, estava ali, mais um torcedor, cada vez mais aprofundado no mundo do basquete e no time, até podendo celebrar aquela bola. 

IS THIS THE DAGGER?

E eu em casa celebrando. (ainda tinha a final, mas essa bola do Kawhi que é o grande momento, vamos admitir.)

Recentemente, vivi com tristeza o fim dessa era que vi nascendo, com a saída de alguns jogadores importantes e a chegada de novos talentos, como Scottie Barnes, para o esse início de uma nova era. 

É interessante notar como os videogames tiveram um papel fundamental na minha história como torcedor. Afinal, foi através dos videogames que me conectei com a maioria dos times que torço. O Washington Redskins de 2012, com Robert Griffin III e Santana Moss, foi outro time que conheci através dos videogames. Joguei tantas partidas com o time que me familiarizei com suas jogadas e estratégias.

Hoje, continuo acompanhando o time com entusiasmo, mesmo que não com a mesma intensidade de basquete. Celebrai com alegria a mudança de dono do time e a mudança do nome para Washington Commanders, mesmo que ainda não me identifiquei completamente com o novo nome. É um passo positivo, no geral, e representa um avanço para a franquia. O esporte do Futebol Americano me dá um pouco de preguiça e dor de cabeça às vezes.

O poder de apresentação e fixação de temas, jogadores e times por causa dos jogos de videogame é, de alguma forma, subestimado. Os videogames foram essenciais para me apresentar a esses times e despertar a paixão de várias torcidas que não seriam conhecidas se não fosse por isso.

Eu não sabia das confusões do Steve Franchise, mas mesmo assim, podia ter ali nascido um fã do Orlando. Aprendi a adorar e até a emular no basquete o Luis Scola. Nada disso aconteceria na minha vida sem os videogames, sem em algum momento ser um “fã modinha”.

Mas sou o primeiro a admitir que sou esquisito, escolho umas modinhas…. incomuns.

Até o maior caso meu de todos né, o time que conheci num videogame que hoje é uma das minhas paixões.

o Deportivo La Coruña.

Fotografia

O meu humor, em geral com o time é por aí

O Fifa Manager e o Deportivo la Coruña

Desde cedo, tive contato com jogos de simulação esportiva, como o Football Manager 00/01. Na época, eu era muito jovem para me aprofundar no jogo e me divertir da maneira que ele muitos puderam, era apenas um jovem clicando botões, torcendo para o Cruzeiro fazer gols, mas ainda não tinha maturidade para me envolver e entender as nuances do jogo.

Foi então que, por acaso, conheci o Total Club Manager. Esse simulador de gestão de times da EA Sports me acompanhou por muitos anos. Lembro-me de um ano, em 2006 ou 2008, a integração entre o Fifa e o Total Club Manager me permitiu comprar jogadores no Fifa Manager e jogar, em uma partida do Fifa “comum”, com os jogadores, camisas, rostos. Foi muito legal.

Ainda guardo a maioria dos CDs e DVDs de instalação dos jogos. 

E até hoje eu jogo. Os mods mantém o jogo vivo até hoje, que sempre acabo jogando uma pequena centena de horas todos os anos. No momento, estou vivendo uma temporada fantástica com o Santa Cruz, tendo conquistado o título brasileiro com um meio de campo formado por jogadores da base.

Vivi muitas histórias marcantes com diversos times. Que tal as conquistas como o título do Sparta Praha sobre o Manchester United, ou o Chelsea campeão da Champions League anos antes com Oliver Kahn no gol, as temporadas mágicas com o Víkingur Gøta tentando colocar as Ilhas Faroé no mapa da Europa! Todas essas são memórias que guardo com carinho.

Mas uma história em particular se destaca em minhas lembranças. Um time espanhol da região da Galícia, com um elenco jovem e promissor, mas ainda em desenvolvimento: o Deportivo La Coruña. 

Enfrentar os gigantes Barcelona e Real Madrid era um grande desafio para o time. Mas persisti naquele save, me aprofundei em tudo sobre o time, desde os jogadores até as contratações que realizei, buscando sempre o melhor resultado. E o time ganhou. 

Empilhou títulos, Champions Leagues, Copa da Liga, Campeonatos Espanhóis. 

E a curiosidade ficou maior, procurei muito sobre e me apaixonei pelo Deportivo La Coruña acompanhando o time de perto, seguindo aquela baita temporada que fizeram no ano. Depois, toda a montanha-russa de emoções com ele: o time caindo, voltando, com alguma dificuldade. 

São diversas histórias que acompanhei ao vivo, e algumas histórias que descobri, tantos anos depois. 

Em 2017, com alguma dificuldade por causa da falta de informações, criei um Twitter para o Deportivo La Coruña, o @lacorunaBR. Segui locais da Galícia, contas de humor e aos poucos fui incluído na comunidade, sendo parte de grupos, me envolvendo cada vez mais com o clube. Alguns pontos de muito sucesso da página foram a contratação do zagueiro Pablo Marí para o Flamengo, a contratação do Seedorf como técnico do Deportivo (e fazendo um péssimo trabalho). E eu, hoje de torcedor de online, me tornei um torcedor… mesmo?

Acompanhei os anos na terceirona com dor no coração, e acompanhado por Gallegos que aguentam meu espanhol fraquíssimo? Até tem o grupo do Dépor dos brasileiros que estão sempre acompanhando os jogos. Nas alegrias e muitas tristezas que esse time nos trás.

Inclusive, quero sempre agradecer ao pessoal dos grupos do Dépor, que foram super legais comigo, quando houve um caso super gratuito de racismo, e ainda assim me abraçaram. É um prazer ser parte de um grupo de pessoas, mesmo tão longe. 

E claro, falar do pessoal da Conexão Brasil-Riazor, a nossa Kombi dos fãs. É uma coisa fantástica ser parte de uma comunidade tão legal.

Tudo isso só existe porque na aleatoriedade da vida escolhi um time naquela tela de “escolha seu time”? Acho que é impossível lutar contra o elemento aleatório no momento da escolha. Mas é um time que eu sou feliz em representar, com uma história muito bonita, uma torcida bacana e uma cidade incrível.

Ainda vou lá. 

Mas uma dúvida me ponderou e acabei pensando. Quando o Modinha sai da modinha e continua? Quando acaba o evento que cria os modinhas? Na primeira fase ruim? E outra, porque cria tanta raiva as “modinhas”?

Fotografia

É tão diferente torcer assim, só porque eu moro na mesma cidade do estádio do meu time?

O início e fim de eras, nostalgia e tudo mais

Meu pai é um bom exemplo disso. Ele nunca foi de acompanhar tanto basquete, mas na época, era fã do Jordan. Viu nele o fogo nos olhos e na alma de um vencedor. Vendo em retrospecto, fico triste de não acompanhado o Kobe Bryant, pois foi logo na época que o Jordan aposentou, e que ele perdeu o hábito de acompanhar o basquete, tenho certeza que ele seria um grande fã do “Bean” e da sua “Mamba Mentality”. Era exatamente o que ele tinha de admiração pelo Jordan, mas com uma camada de marketing.

Ironicamente, alguns anos depois ele viu isso no Lebron, um jogador com longevidade e histórico praticamente sem precedentes na NBA. E ele segue firmemente o James em todos os times. Cleveland, Miami (onde tive a sorte de ver ele ao vivo junto com ele), Cleveland de novo, Lakers. Tudo com um carinho com a pessoa dele. O que é muito fofo.

Ele poderia em todas as métricas ser visto como um torcedor menor. Sem paixão com um time, sem aquele fanatismo que liga umbilicalmente a pessoa ao time. Uma dúvida rápida me vem. Isso deveria ser considerado algo tão ruim assim? Penalizar alguém que está conhecendo o time ou que torce de forma menos individualizada?

No fundo, é aquele desejo íntimo e infinito nosso de nos considerarmos diferentes. Mais resilientes, mais inteligentes, mais capazes de aguentar as fases ruins. Eu mesmo tenho isso internalizado com muita força, com um certo orgulho de “suportar” as fases ruins dos clubes para termos as boas. Cruzeiro na Série B, a reconstrução do Toronto Raptors, o pesadelo infinito do Deportivo La Coruña, a existência do Washington Commanders. Tudo isso serve como um auto-lembrete de que o fanatismo se manifesta além das vitórias e conquistas.

Mas afinal, quem não tem isso deveria ser considerado inferior? Não sei, pra ser honesto.

Na era da informação, temos acesso a uma infinidade de conteúdo sobre nossos times favoritos, desde podcasts e vídeos até transmissões ao vivo e programas de TV. E, claro, as redes sociais se tornaram um espaço para debates acalorados sobre qualquer aspecto do time, desde o treinador de goleiros até quem escolher no draft.

Nunca foi tão fácil se aprofundar no universo de um time. Nessa contemporânea forma de acompanhar os esportes, as histórias, eras e fases dos times se transformam a um ritmo acelerado. Em uma temporada, existem diversas histórias que podem se tornar realidade ou serem destronadas na mesma velocidade, e podem começar de todas as formas: um uniforme bonito, um tweet engraçado, um relacionamento com uma cantora, todas são formas igualmente válidas de se conhecer um time.

E esse relacionamento se mantém ou não. Tem muito o que se falar, tanto no positivo quanto no negativo.

Afinal, torcer hoje é muito sobre pertencimento, identidade e expressão, como eu demonstro claramente como Real Club Deportivo La Coruña, ou até mesmo com a Fórmula 1, um tema que pouco explorei aqui. 

A F1 é um bom exemplo inclusive de quem gosta mais dos “jogadores” que dos “times”. Eu até gosto da Williams, mas sempre botei o piloto antes, na hora de torcer. Hamilton, Ricciardo, Massa, Barrichello. Torcia e torço muito mais pra eles do que pra equipe deles.

Enfim.

Em resumo, o fanatismo pode nascer das mais diversas formas, desde a influência familiar até a paixão por um jogador ou um momento marcante. O importante é que essa paixão seja autêntica e nos traga alegria e significado, mesmo que temporária.

Vou tentar ter a cabeça mais aberta, para que os “modinhas” sejam sempre bem-vindos ao mundo do esporte, pois podem se tornar grandes fãs no futuro, ou não. Mas que se divirtam no caminho.

Os meninos do Grupo do Lakers começaram sendo fãs do Kobe Bryant, e hoje são fãs fanáticos do Lakers. Eu comecei nos meus videogames. Quantos fãs do Chicago Bulls, do Golden State Warriors, do San Francisco 49ers, do São Paulo Futebol Clube, do Real Madrid nasceram em suas épocas de dominância?

No fundo, será que sou tão diferente assim de um torcedor do Chelsea, do Manchester City, da seleção da Bélgica ou de um estrangeiro que adora a seleção brasileira?

Será que posso dizer… viva os modinhas?

Não tenho certeza nem que essa discussão é válida de alguma forma, ou é apenas mais um devaneio da minha cabeça? De qualquer forma, torço para que a paixão nascida nesses momentos possa florescer e, quem sabe, surjam mais loucos pelos times. Por isso, peço, encarecidamente:

JOGUEM MAIS COM O DEPORTIVO LA CORUÑA

por favor?

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